A MAIOR PARTE DA REFEIÇÃO É
INSOSSA: um mingau cinzento morno. Só o peixe é bom: bacalhau tirado direto do
mar. Tem gosto de sal e oceano, como o ar da região.
Kilorn fica maravilhado,
perguntando-se inutilmente que tipo de rede a Guarda usa. Nós estamos numa rede, seu idiota, quero gritar, mas o refeitório
não é lugar para isso. Aqui também há pessoas de Lakeland, todos resignados em
seus trajes azul-escuros.
Enquanto os rebeldes de
uniforme vermelho comem com o resto dos refugiados, os de Lakeland jamais se
sentam, permanecendo em ronda constante. Lembro dos agentes de segurança e
sinto um calafrio familiar. Tuck não é tão diferente de Archeon. Facções diferentes
rivalizam pelo controle, e estou bem no meio. E Kilorn, meu amigo, meu amigo
mais antigo, talvez não acredite que isso é perigoso. Ou pior: talvez entenda, mas
não se importe.
Meu silêncio continua. É
quebrado apenas pelas mordidas no peixe. Eles me observam de perto, como foram
instruídos. Minha mãe, meu pai, Kilorn, Gisa: todos fingem não me observar, mas
eu percebo. Os garotos voltam ao leito de Shade. Como eu, acreditavam que ele
estava morto, e agora querem recuperar o tempo perdido.
— E então, como vocês
vieram parar aqui? — As palavras parecem grudadas na minha boca, mas forço a
saída. É melhor eu fazer minhas perguntas antes que façam as deles.
— De barco — meu pai
responde grosseiramente entre uma colherada e outra.
Ele ri um pouco da própria
piada. Abro um pequeno sorriso para agradar.
Minha mãe o cutuca,
estalando a língua de irritação.
— Você sabe o que ela quis
dizer, Daniel.
— Não sou burro — ele
resmunga, tornando a enfiar a colher na tigela. — Dois dias atrás, por volta da
meia-noite, Shade surgiu na varanda. Quer dizer, surgiu mesmo, do nada. — Ele
gesticula com as mãos, estalando os dedos. — Você sabe disso, não sabe?
— Sei.
— Ele quase nos matou do
coração aparecendo assim do nada... e vivo.
— Imagino — balbucio,
lembrando da minha própria reação ao ver Shade de novo.
Pensei em nós dois mortos,
em algum lugar bem distante desta loucura. Mas, como eu, Shade apenas se tornou
alguém — alguma coisa — diferente para sobreviver.
Meu pai continua, realmente
agitado. Quando gesticula, a cadeira balança e faz as rodas rangerem.
— Bom, depois que a sua mãe
parou de chorar em cima dele, Shade pôs mãos à obra. Começou a jogar coisas
dentro de uma mala, coisas inúteis. A bandeira da varanda, as fotos, sua caixa
de cartas... Não fazia sentido, mas é difícil perguntar alguma coisa para um
filho que voltou dos mortos. Quando ele disse que precisávamos sair naquele
instante, deu pra ver que não estava brincando. Então saímos.
— E o toque de recolher?
Vocês poderiam ter sido mortos!
As Medidas ainda estavam
nítidas na minha mente. Eram espinhos na minha pele. Como poderia esquecê-las
quando eu mesma fui forçada a anunciá-las?
— Tínhamos Shade e seus...
seus... — Meu pai sofre para encontrar a palavra certa, gesticulando.
Gisa revira os olhos,
incomodada com os trejeitos do nosso pai.
— Ele chama de saltos,
lembra?
— Isso — ele confirma. — Shade
nos fez saltar para além das patrulhas, para dentro da floresta. De lá, fomos
para o rio e para o barco. O transporte de cargas ainda é permitido à noite,
você sabe, então acabamos confinados dentro de uma caixa de maçãs por sabe-se
lá quanto tempo.
Minha mãe fica tensa só de
lembrar.
— Maçãs podres — ela
acrescenta.
Gisa ri um pouco. Meu pai
quase ri também. Por um momento, o mingau cinza se transforma no guisado ruim
da minha mãe, as paredes de concreto são de madeira mal cortada, e a cena vira
um jantar no lar dos Barrow.
Estamos em casa de novo, e
sou apenas Mare.
Deixo o tempo passar,
ouvindo e sorrindo. Minha mãe fica tagarelando, então não preciso falar, o que
me permite comer em uma paz silenciosa. Ela até repele a curiosidade da
multidão no refeitório, encarando qualquer um que me lance o olhar maldoso que
conheço tão bem. Gisa também faz sua parte, distraindo Kilorn com as últimas
notícias de Palafitas. Ele ouve, interessado, e ela morde o lábio, contente em ter
a atenção dele. Acho que a quedinha que sentia pelo meu amigo ainda não acabou.
Isso deixa meu pai sozinho,
sorvendo à vontade sua segunda porção de mingau. Ele me espia por cima da
tigela, e vislumbro o homem que foi um dia. Alto, forte, um soldado orgulhoso,
uma pessoa de quem mal me lembro, tão distante do que é agora. Mas, assim como
eu, como Shade, como a Guarda, meu pai não é o coitado, o bobo que aparenta.
Apesar da cadeira, da perna
que falta e dos ruídos mecânicos no peito, já viu mais batalhas e sobreviveu
por mais tempo que muitas pessoas. Ele perdeu a perna e o pulmão apenas três
meses antes de receber a baixa, depois de quase vinte anos de serviço militar.
Quantos chegaram tão longe?
Parecemos
fracos porque queremos. Talvez essas palavras não sejam de
Shade afinal, mas do nosso pai.
Embora tenha acabado de
descobrir minha própria força, ele esconde a dele desde que voltou para casa.
Recordo a fala dele ontem, meio oculta pelos sonhos: “Sei como é matar uma
pessoa”. Com certeza não duvido disso.
É estranho, mas a comida me
faz lembrar de Maven — não o gosto em si, mas o ato de comer. Minha última
refeição foi ao lado dele, no palácio. Bebemos em cálices de cristal e meu
garfo tinha um cabo perolado. Estávamos rodeados de criados, mas sozinhos. Não
podíamos conversar sobre a noite que se aproximava, mas eu não conseguia parar
de lançar olhares para ele, torcendo para não perder o controle. Ele me deu
tanta força naquele momento...
Acreditei que ele tinha me
escolhido, escolhido a minha revolução. Acreditei que Maven era o meu salvador,
minha bênção. Acreditei que ele podia nos ajudar. Os olhos dele eram tão azuis,
cheios de um tipo diferente de fogo. Uma chama voraz, intensa e estranhamente
fria, manchada de medo. Pensei que sentíamos medo juntos, pela nossa causa, um
pelo outro.
Estava muito enganada.
Devagar, afasto o prato de
peixe, que raspa o tampo da mesa. Chega.
O ruído, como um alarme,
atrai o olhar de Kilorn, e ele vira a cabeça para me encarar.
— Terminou? — pergunta,
vendo meu prato pela metade.
Em resposta, me levanto, e
ele se põe de pé ao mesmo tempo, como um cachorro seguindo ordens.
Mas não ordens minhas.
— Podemos ir para a
enfermaria? — peço.
O pedido foi feito com
cuidado, para fazê-lo esquecer o que sou agora.
Ele faz quem sim, sorrindo.
— Shade está cada vez
melhor. Bom, que tal um passeio, família Barrow? — acrescenta, lançando um
olhar para o grupo, o mais próximo de uma família que ele já teve.
Arregalo os olhos. Tenho
que falar com Shade para descobrir onde está Cal e quais os planos do coronel
para ele. Por mais que tenha sentido saudade da minha família, eles só vão
atrapalhar. Por sorte, meu pai compreende. Ele passa a mão rápido para baixo da
mesa e interrompe minha mãe antes que ela consiga responder, se comunicando sem
palavras. Ela se ajeita na cadeira, soltando um sorriso de desculpas que seus
olhos não refletem.
— Vamos mais tarde, acho —
ela diz, dando a entender bem mais do que isso. — Já é hora de trocar a
bateria, não é?
— Saco — meu pai resmunga
alto, soltando a colher dentro da tigela de gororoba.
Os olhos de Gisa saltam até
os meus e leem minha necessidade. Tempo, espaço, uma chance de começar a
entender esta bagunça.
— Tenho que preparar mais
uns estandartes — suspira. — Vocês gastam tudo rápido demais.
Kilorn não se abala com as
desculpas educadas e sorri, como sempre.
— À vontade. É por aqui,
Mare.
Por mais condescendente que
pareça, eu o deixo me guiar pela confusão. Faço questão de tornar a caminhada
um espetáculo, mancando, mantendo o olhar baixo. Luto contra o ímpeto de
encarar todos que me observam: os rebeldes, o pessoal de Lakeland, os
refugiados. O que aprendi na corte do rei morto continua sendo útil na base
militar, onde mais uma vez preciso esconder quem sou.
Lá, fingia ser prateada,
inabalável, destemida, um pilar de força e poder chamado Mareena. Mas essa
garota estaria ao lado de Cal, confinada no Galpão 1. Então preciso voltar a
ser vermelha, a ser uma garota chamada Mare Barrow de quem ninguém deveria ter
medo ou suspeitar, que se apoia num garoto vermelho e não nela mesma.
O aviso de meu pai e de
Shade nunca foi tão claro.
— A perna ainda está
doendo?
Estou tão concentrada em
fingir a lesão que mal ouço as palavras preocupadas de Kilorn.
— Não é nada — respondo
afinal, apertando os lábios numa linha fina de dor forçada. — Já passei por
coisa pior.
— Lembro de você pulando da
varanda de Ernie Wick — ele recorda com os olhos brilhando.
Quebrei a perna naquele
dia, e passei meses com um gesso que custou a nós dois metade das economias.
— Não foi culpa minha —
digo.
— Acho que você quis fazer
aquilo.
— Me desafiaram.
— Ora, mas quem teria feito
uma coisa dessas?
Ele ri descaradamente
enquanto abre caminho para nós por duas portas. Fica claro que o corredor após
a segunda porta é um acréscimo recente. A tinta ainda parece fresca em alguns lugares
e as luzes oscilam no teto. Fiação ruim, percebo de imediato, sentindo os
pontos em que a eletricidade cai e se divide. Mas um cabo de força se mantém
inteiro, fluindo pela passagem à esquerda. Para minha tristeza, Kilorn nos leva
pela direita.
— O que tem pra lá? —
pergunto, apontando para o caminho oposto.
— Não sei — ele não mente.
A enfermaria de Tuck não é
tão tenebrosa quanto o posto médico do mersivo. As janelas altas e estreitas
estão escancaradas, inundando o cômodo com ar fresco e luz do sol. Jalecos
brancos vão e vêm por entre os pacientes, cujos curativos felizmente estão limpos
de sangue vermelho. Conversas suaves, algumas tosses secas e alguns espirros preenchem
o ambiente. Não há um único gemido de dor ou estalido de osso. Ninguém aqui está
morrendo. Ou quem estava simplesmente já morreu.
Não é difícil encontrar
Shade, que desta vez não está dormindo. Sua perna ainda está levantada, apoiada
numa tipoia mais profissional, e o curativo em seu ombro é novo. Inclinado para
a direita, ele encara o leito do lado com uma expressão resignada.
Ainda não consigo saber com
quem está falando. Duas cortinas — uma de cada lado do leito — escondem o
ocupante do resto da enfermaria. Ao nos aproximarmos, vejo que a boca de Shade
se move rápido, sussurrando palavras que não consigo decifrar.
Ele interrompe a conversa
ao me avistar, e tenho a sensação de ser traída.
— Você acabou de perder a
chance de ver os brutamontes — ele anuncia, se ajeitando no leito para me dar
espaço. Uma enfermeira se dispõe a ajudar, mas ele pede que ela se afaste,
gesticulando com a mão inchada.
Os brutamontes. É o velho
apelido que deu aos nossos irmãos. Shade não cresceu muito, então servia de
saco de pancada para Bree com frequência. Tramy era mais bondoso, mas sempre
seguia os passos violentos de Bree. Com o tempo, Shade se tornou mais esperto e
ligeiro que os dois e conseguia escapar, e me ensinou a fazer o mesmo. Não
duvido que ele tenha pedido para eles saírem de lá a fim de ter mais privacidade
para falar comigo — e com quem quer que esteja do outro lado da cortina.
— Ótimo. Eles já estão me
dando nos nervos — respondo com um sorriso bem-humorado.
Vendo de fora, a gente
talvez pareça apenas dois irmãos alegres. Mas Shade é esperto, e seus olhos
escurecem quando chego ao pé do leito. Ele nota meu passo manco forçado e faz
um aceno milimétrico com a cabeça. Imito o gesto. Mensagem recebida, Shade, alta e clara.
Antes mesmo de eu insinuar
uma pergunta sobre Cal, outra voz me interrompe.
Cerro os dentes ao ouvi-la,
me esforçando para manter a calma.
— O que está achando de
Tuck, garota elétrica? — Farley pergunta do leito isolado ao lado de Shade. Ela
joga as pernas para fora e me encara, segurando o lençol com os punhos
cerrados. A dor atravessa seu lindo rosto arruinado pela cicatriz. É uma
pergunta fácil de driblar.
— Ainda estou decidindo.
— E o coronel? O que acha
dele? — ela continua, baixando a voz. Seus olhos estão alertas, indecifráveis.
Não há como saber o que ela
quer ouvir. Então, em vez de responder, dou de ombros e me ocupo com a
arrumação dos cobertores de Shade.
Os lábios dela se contorcem
para formar algo semelhante a um sorriso.
— Ele costuma causar uma
tremenda primeira impressão. Precisa provar que está no comando cada vez que
respira, especialmente perto de gente como vocês dois.
Contorno o leito de Shade
rapidamente, postando-me entre Farley e meu irmão. No meu desespero, esqueço de
mancar.
— É por isso que ele levou
Cal? — disparo rápida e afiada. — Não dá para deixar um guerreiro como ele à
solta por aí arruinando a reputação do coronel?
Ela baixa os olhos,
envergonhada.
— Não é por isso que ele
levou o príncipe.
O medo brota no meu
coração.
— Então por quê? O que ele
fez?
Ela não tem chance de me
contar.
Um silêncio estranho recai
sobre a enfermaria, sobre as enfermeiras, sobre meu coração e sobre as palavras
de Farley. Não conseguimos ver a porta atrás das cortinas dela, mas escuto
botas marchando rápido.
Ninguém fala, embora alguns
soldados batam continência nos leitos à medida que o ruído das botas se aproxima.
Couro preto coberto de areia molhada, cada vez mais perto. Até Farley se
arrepia ao vê-las se aproximando, e crava as unhas no colchão.
Kilorn chega mais perto, me
escondendo um pouco com seu tamanho, enquanto Shade faz o máximo para conseguir
sentar.
Mesmo que o pavilhão médico
esteja lotado de vermelhos feridos e supostos aliados, uma pequena parte de mim
pede o poder do raio. A eletricidade se acende no meu sangue bem ao meu
alcance, caso eu precise.
O coronel contorna a
cortina com o olho vermelho fixo e fulminante. Para minha surpresa, seu olhar
pousa em Farley, me poupando por enquanto. Os acompanhantes — de Lakeland, pelo
uniforme — parecem versões pálidas e sombrias do meu irmão Bree. São um
conjunto de músculos, altos como árvores, e obedientes. Ladeiam o coronel em
movimentos treinados, assumindo posições ao pé dos leitos de Farley e Shade. O
coronel fica parado entre eles, encurralando Kilorn e eu. Provando que está no
controle.
— Escondida, capitã? — o
coronel pergunta, batucando a cortina do leito de Farley.
Ela bufa ao som da patente
e da insinuação. Quando ele estala a língua, desdenhando, dá para ver o corpo
dela estremecer.
— Você sabe que o fato de
ter público não vai te proteger — o coronel prossegue.
— Tentei fazer tudo o que
você pediu, o difícil e o impossível — ela contra-ataca. Suas mãos tremem,
agarradas aos cobertores. Tremem de raiva, não de medo. — Você me deixou cem
soldados para derrubar Norta, um país inteiro. O que esperava, coronel?
— Esperava que você
voltasse com mais do que vinte e seis deles. — A réplica cai pesada sobre
Farley. — Esperava que você fosse mais inteligente que um principezinho de
dezessete anos. Esperava que você protegesse seus soldados, não que os atirasse
num covil de lobos prateados. Esperava muito mais de você, Diana, mais do que
você me deu.
Diana. O nome é o golpe de
misericórdia. Seu nome verdadeiro.
Os tremores de raiva de
Farley se transformam em vergonha e a reduzem a uma casca vazia. Ela encara os
pés, cravando os olhos no chão. Conheço bem a expressão no rosto dela, a
expressão de uma alma arrasada. Uma palavra, um movimento, e tudo desaba. Na
verdade, ela já está começando a se desfazer, arruinada pelo coronel, pelas palavras
dele e pelo próprio nome.
— Eu a convenci, coronel.
Parte de mim deseja que
minha voz saia trêmula, para que esse homem ache que tenho medo dele. Mas já
encarei coisa muito pior do que um soldado mal-humorado com o olho
ensanguentado. Muito, mas muito pior.
Gentilmente, empurro Kilorn
para o lado e dou um passo à frente.
— Dei minha palavra sobre
Maven e o plano dele. Se não fosse por mim, seus homens e mulheres estariam
vivos. O sangue deles está nas minhas mãos.
Para minha surpresa, o
coronel apenas ri da minha declaração.
— Nem tudo gira ao seu
redor, srta. Barrow. O sol não se põe ou se levanta ao seu comando.
Não foi isso o que eu quis
dizer. Essa resposta soa idiota, mesmo dentro da minha cabeça.
— Os erros são dela e de
mais ninguém — ele continua, voltando a encarar Farley. — Você está destituída
do seu comando, Diana. Algum questionamento quanto a isso?
Por um breve e intenso
momento, Farley dá a entender que sim. Mas em seguida baixa a cabeça e se
fecha.
— Não, senhor.
— Essa é a sua melhor
decisão em semanas — ele emenda, se virando para ir embora.
Mas Farley ainda não
terminou. Ela levanta o olhar mais uma vez.
— E a minha missão?
— Missão? Que missão? — O
coronel parece mais intrigado do que irritado, e seu olho bom salta da órbita. —
Não fui informado de novas ordens.
Farley olha para mim e
sinto uma simpatia estranha por ela. Mesmo derrotada, ela ainda luta.
— A srta. Barrow tinha uma
pista interessante, que pretendo seguir. Creio que o Comando vai concordar.
Quase sorrio para Farley,
encorajada por sua declaração diante de um oponente como esse.
— Que pista é essa? — o
coronel quer saber, voltando-se para mim. Ficamos tão próximos que consigo ver
os diversos redemoinhos de sangue se movendo devagar no olho dele, como nuvens
ao vento.
— Recebi uma lista de
nomes. De vermelhos como meu irmão e eu, nascidos com a mutação responsável
pelos nossos... poderes. — Preciso convencê-lo. Preciso. — Eles podem ser encontrados, protegidos e treinados. São
vermelhos como nós, mas fortes como os prateados, capazes de lutar contra eles
em campo aberto. Talvez até poderosos o bastante para ganhar a guerra. — Minha
respiração sai trêmula e ruidosa, e meu peito se agita quando penso em Maven. —
O rei sabe da lista, e com certeza vai matar todos se não os encontrarmos
primeiro. Ele não vai deixar uma arma tão poderosa passar — finalizo.
O coronel se cala por um
instante; só sua mandíbula se move enquanto ele pensa. Ele chega até a correr
os dedos pela correntinha escondida debaixo da gola. Consigo entrever os elos
de ouro entre os dedos dele, um prêmio tão caro que nenhum soldado poderia ter.
Gostaria de saber de quem a
roubou.
— E quem te deu esses
nomes? — ele pergunta num tom difícil de interpretar. Para um bruto, ele tem
uma capacidade surpreendente de esconder o que pensa.
— Julian Jacos — respondo.
Meus olhos se enchem de lágrimas ao dizer o nome, mas não as deixo cair.
— Prateado — o coronel
desdenha.
— Simpatizante — rebato,
bufando. — Foi preso por resgatar a capitã Farley, Kilorn Warren e Anna Walsh.
Ele ajudou a Guarda Escarlate, ficou do nosso lado. E provavelmente está morto
por isso.
O coronel inclina o corpo
para trás, apoiado nos calcanhares, ainda com um ar de desprezo.
— Ah, o seu Julian ainda
está vivo.
— Vivo? — balbucio,
chocada. — Mas Maven disse que o mataria...
— Estranho, não é? O rei
Maven deixar um traidor desses respirando? — ele diz, achando graça na minha
surpresa. — A meu ver, o tal Julian nunca esteve do seu lado. Ele lhe deu a
lista para que você a passasse para nós, assim a Guarda ficaria procurando por
uma coisa que não existe e cairia em outra armadilha.
Todo
mundo pode trair todo mundo. Mas me recuso a acreditar que Julian
seja capaz disso. Eu o conheço bem o suficiente para saber onde ele pôs a
lealdade: em mim, em Sara e em qualquer um que se oponha à rainha que matou a
irmã dele.
— E mesmo assim, se a lista
for verdadeira e os nomes realmente levarem a outras... — Ele procura a palavra
sem se preocupar em ser educado. — ... coisas como você, e daí? Vamos nos
esgueirar entre os piores agentes do reino, mais rápidos e preparados do que
nós, para encontrá-las? Tentamos um êxodo em massa com as que conseguirmos
salvar? Fundamos uma Escola Barrow para Aberrações e passamos anos treinando-os
para lutar? Ignoramos todo o resto, os soldados, as crianças, as execuções, por
causa deles?
O coronel balança a cabeça,
fazendo os músculos grossos do seu pescoço saltarem.
— Esta guerra vai ter
acabado e nossos corpos estarão frios antes de avançarmos um milímetro sequer
nessa sua missão. — Ele vira para Farley, nervoso. — O resto do Comando vai
dizer a mesma coisa, Diana, então a não ser que você queira bancar a idiota de
novo, sugiro que fique quieta.
Cada um dos argumentos dele
é como um golpe de martelo que me esmaga. Ele está certo sobre algumas coisas.
Maven vai enviar quem tem de melhor para caçar e matar as pessoas da lista. Vai
tentar manter tudo em segredo, o que deixará as coisas um pouco mais lentas.
Certamente vamos encontrar
uma armadilha. Mas, se existir ao menos uma chance de encontrar outro soldado
como eu, como Shade, será que o risco não vale a pena?
Abro a boca exatamente para
lhe dizer isso, mas ele ergue a mão.
— Não quero ouvir mais nada
sobre isso, srta. Barrow. E, antes que você faça algum comentário insolente e
me desafie a detê-la, lembre-se do seu juramento. Você prometeu ser leal à
Guarda Escarlate, e não aos seus motivos egoístas. — Ele aponta para os
soldados feridos que lotam a enfermaria, todos machucados por lutar por mim. —
E se o rosto deles não basta para manter você na linha, lembre-se do seu amigo
e da situação dele aqui.
Cal.
— Você não ousaria
machucá-lo.
O olho vermelho dele
escurece, revirando-se de raiva.
— Para proteger os meus
soldados, pode apostar que sim. — O canto dos seus olhos se erguem, revelando
um sorriso malicioso. — Igual a você. Não se engane, srta. Barrow. Você feriu
pessoas para alcançar os próprios objetivos. Sobretudo o príncipe.
Por um instante, é como se
meus olhos estivessem nublados de sangue. Só enxergo vermelho, um ódio lívido.
As faíscas correm para a ponta dos meus dedos, dançando embaixo da pele, mas
cerro os punhos e as contenho. Quando minha vista clareia, as luzes oscilando
no teto são o único indício da minha fúria, e o coronel já não está mais
presente. Nos deixou a sós e em ebulição.
— Calma, garota elétrica —
Farley murmura, sua voz mais suave do que jamais ouvi. — Nem tudo está tão
ruim.
— Não? — vocifero entre os
dentes.
Minha única vontade é
explodir, deixar meu verdadeiro eu sair e mostrar a essa gente fraca exatamente
com quem estão lidando. Mas com isso eu só conseguiria uma cela, no melhor dos
casos, ou um tiro, no pior. E teria que morrer com a consciência de que o
coronel está certo. Já causei muitos danos, e sempre às pessoas mais próximas.
Porque
achei que tinha razão, digo a mim mesma. Porque
achei que era o melhor a fazer.
Em vez de me consolar,
Farley endireita a coluna, senta apoiada na cabeceira da cama e me assiste
fumegar. O ar de criança envergonhada desaparece com uma facilidade chocante.
Outra máscara. A mão dela sobe até o pescoço e puxa uma corrente de ouro igual
à do coronel. Não tenho tempo para especular sobre essa ligação. Porque algo
pende do colar. Uma chave de ferro pontuda. Não preciso perguntar onde está a
fechadura correspondente. Galpão 1.
Como se não fosse nada,
Farley joga a chave para mim com um sorriso preguiçoso na cara.
— Logo você vai perceber
que sou ótima para dar ordens, mas péssima para segui-las.
cara a mare ta se achando de mais pro meu gosto.
ResponderExcluirNé? Também acho!! Aff...
ExcluirTambem acho. Ela não é mais forte do que alguém que passou a vida inteira treinando co poderes... De nada adianta força sem experiencia
ExcluirEu também to achando isso mas na minha opinião se ela não for tudo isso que ela tá se achando ela nn é nada então ela perde a coragem kkkkk então acho que assim é melhor.
ExcluirEu a acho muito impetulante, não que seja sempre ruim, mas precisa escolher melhor quando brigar e quando quietar.
Excluirpelo menos dá pra ver que a Mare tem CONFIANÇA XD melhor do que ela sair chorando pelos cantos dizendo "Eu sou inútil.Não vou conseguir.Meu poder é uma aberração.Eu sou um monstro" Se é que vocês me entendem ;)
ExcluirEla pode tá meio insolente, mas p quem passo p traição,tem sangue nas mãos p própria escolha, levou a morte de muita gente só por ter ser tornado quem é,e foi humilhada pq causa do sangue, ela tinha q ser isso mesmo. Pq ou se sai forte de uma situação ou se é engolida por ela.
ExcluirMas a sinopse diz q ela tem que tomar cuidado p nao se tornar o q ela combate, talvez seja isso.
ExcluirCONCORDO, A POBE FOI A MAIS BURRA DE TODOS, E TA SE ACHANDO A PODEROSONA...KKKKKK ESPERO QUE ELA SEJA ISSO TUDO MESMOS -_-
ResponderExcluirTo gostando da Diana!
ResponderExcluirNossa, acho q me identifiquei com alguma deusa romana...
ResponderExcluirTambém gosto muito da Diana. Já a Mare me dá tanta raiva que tenho que dar uma pausa no livro de vez em quando e dar uma voltinha.
ResponderExcluirto contigo. A Diana e o Shade são os melhores persoangens até agr. Já a Mare... um saco.
ExcluirFarley e Mare....sera que???kkkkkk
ResponderExcluirmiga....não pira!!!!!!
ExcluirPira não, calma kkkkkkk
ExcluirMare está abusando demais...Mas concordo com ela. E Farley <3
ResponderExcluirGente se toquem. Ela É a dona da poha toda. Só de ela se controlar e saber que não pode fazer tá ótimo
ResponderExcluirMas não significa que tenha que ficar se achando tanto. Comecei o livro com tantas expectativas, porém a autora ta me decepcionando com esse modo de agir da Mare... realmente quero que ela quebre a cara mais para a frente e veja que não é isso tudo, aliás autores deveriam dar um fim no protagonismo.
ExcluirAhh... pode ter certeza que ela quebra a cara sim!
ExcluirE quebra bem feio mesmo!
A Mare tá se achando um pouco sim, mas isso é ótimo. O que vocês queriam, uma Mary Sue? Se od personagens não tiverem defeitos, ficam irreais.
ExcluirSó um detalhe, esse coronel, o titulo coronel é da Guarda escarlate ou ele é coronel de Lakalande?
ResponderExcluirPois se for coronel de Lakalande (o que acho mais provavel, pois usam o azul do pais e tem todos os agentes, se ele não fosse da elite de lá, e apenas um oficial da Guarda que veio de Lakalande usaria o vermelho), reparem que a Mare diz que ele tem sangue Vermelho no olho, ou seja Lakalande teria um patente militar vermelho (levando em conta que eles tem o mesmo tipo de sociedade de Norta).
Enfim não entendi isso...
Da Guarda Escarlate. Lá cada integrante tem uma patente.. Como um exército, mesmo
ExcluirAinda desconfio mt desse coronel. Desconfio do comando, afinal eles são de lakalande(inimigos de norta). Se eles n qrem criar um exercito de sanguesnovos de norta, pode ser q seja por medo de depois de derrubar o rei esse exercito se volte contra lakalande.
ResponderExcluirAcho q o objetivo do comando é acabar com norta.
Exatamente
ExcluirTODO MUNDO PODE TRAIR TODO MUNDO.
Excluirnão dá pra tirar isso da cabeça
Vamo abaixa um pouco a bola ai mare
ResponderExcluir"Minha única vontade é explodir, deixar meu verdadeiro eu sair e mostrar a ESSA GENTE FRANCA exatamente com quem estão lidando."
ResponderExcluirGente a Mare tá se achando muito, ela ñ é td isso ñ, vai quebrar muito a cara ainda
Pois eu n acho! Ela é sim muito poderosa mas nós só vemos oque a autora do livro deixa a gente ver sobre ela,n sabemos do que ela é capaz,se ela diz que quer mostrar seu verdadeiro ser,quer dizer que ela esconde algo muito maior do que a gente pensa,agr pensem só: ela é elétricidade viva! Pensem só oque esse poder significa! Ela poderia matar ou desligar tudo num piscar de olhos,ela n está se "achando" ela está dizendo a verdade ela é mais poderosa do que qualquer um aí!
ExcluirFINALMETE!alguém que pensa como eu
Excluirtbm acho isso,Kamila!
Alguém que pensa como eu... não gosto desse coronel.
ExcluirNOSSA, SIMMMMM!!!!! A Mare é muito poderosa e ela sabe disso, parece que esse povo se cega e acha que é ego inflado. Só aguardem até ela ter um surto estrondoso rs
ExcluirGalera eu sei que ta todo mundo puto com o jeito da Mare, mas tentem olhar pelo vies psicológico da coisa. A moça passou por grandes abalos emocionais, foi traída, está sobre grande pressão e estresse, então se agarra com força ao que ela acredita e diz ter, que é o seu poder. Ela se sente perdida e está criando uma casca de proteção contra isso tudo. Não que justifique seus pensamentos, mas é entendível que ela esteja se portando como uma prateada. Eles fazem isso também, de se acharem poderia. No fundo eles tem medo, estão desesperados pra encontrar uma forma de controle por acharem que tem o direito, pois tudo o que conhecem, e se agarram, é seu poder.
ResponderExcluirAleluia!!!
ExcluirAchei q era a unica com esse pensamento.Ela as vezes pensa errado? Pensa, mais no final e verdade. Olha tudo o q ela já consegui fazer com o poder dela...
Ps:Pra mim o único poder mais interessante, porem n mais forte q o dela e o da vaca coroada kkkkkk
UFA finalmente alguém que pensa igual a mim, sei que não é certo ela esta pensando assim, porém é a unica forma de ela suportar tudo, os irmãos frios com ela, foi traída por quem achou estar ao lado dela, ela ta tentando proteger todos com a lista e a unica coisa que as pessoas tão focando é a forma dela pensar.
ExcluirAINDA BEEEEEEEEM!!!!!!!!!
ExcluirÉ TÃO BOM ENCONTRAR GENTE QUE PENSA COMO EU !(tô me sentindo a Mare descobrindo sobre os sanguenovos XD) JÁ TAVA ME SENTINDO DESLOCADA POR COMPREENDER A MARE!
Não gosto desse coronel!Todo mundo pode trair todo mundo !
ResponderExcluirFarleeeeeeeeeey,sua divaaaaaaaaa!!!!!!ARRAZOU!!!! GANHOU PONTOS POR ISSO!
Marezinha,embora eu não te culpe por tá agindo assim,você tá incomodando em uma coisinha: COMO PODE ACREDITAR NO MAVERDA????????????SE ELE DISSE "O JULIAN MORREU" É CLAAAAAAARO QUE ELE TÁ VIVO,MULHER!!!!!!SERÁ POSSÍVEL QUE ELE VÁ TE DIZER QUE A LUA É LARANJA E VC VÁ ACREDITAR??????NÃO,NÉ AMOR!PARA QUE TÁ FEIO!!!!!
pronto desabafei....
Não consigo confiar mais em vermelhos nem prateados. realmente TODO MUNDO TRAI TODO MUNDO. SO sinto dó da Mare por ser tão BURRA(EU TBM ACREDITEI NO MARVEN AQUELE FDP) e do Cal por ter perdido tudo ( MAS SE BEM QUE ELE ERA UM FDP OPRESSOR E POR UM LADO MERECE ESTAR NO MUNDO DOS VERMEHOS). não consigo más apoiar a causa depois de tantas mortes e de os vermelhos serem tão fracos. pqp e estou com raiva dos 2 irmãos da Mare e do Kilorn. depois de tudo que ela feZ por eleS....affs rançoooooooo
ResponderExcluir"Logo vai perceber que sou ótima para dar ordens, mas péssima para segui-las." — Essa é das minhas! 😜😜😜
ResponderExcluirJá odeio esse Coronel não é a Mare que se acha e sim esse homem! A Mare está certa em querer achar os outros e treina-los pois é a única chance que eles tem pois ela , o Cal e o irmão não tem como vencer só os três! Sim morrem muitos vermelhos pra ajuda-la mas ela ainda é a melhor chance deles, isso é fato!! E estou amando a Farley por não se permitir aceitar as coisas assim, e não confio nesse Coronel, fico triste que os irmãos da Mare tirando o Shade é o único estar ao seu lado como ela e o Cal vão fugir? Acho que a Mare vai ter que colocar esse Coronel no seu lugar e ver com quem está realmente lidando assim como todos que estão cegos pro que esta realmente acontecendo a sua volta, de certa forma se tornaram prisioneiros! Tenho medo do que pode ter acontecido com o Cal, e não acredito que o Julian tenha traído a Mare!? DM
ResponderExcluirNao entendo vocês falando que a Mare ta se achando a poderosíssima. Na verdade, ela esta super certa. Ela passou por muitas coisas e sobreviveu mais que muitos sobreviveriam. N verdade, estou com raiva da Diana, da família dela e de todos por estarem com medo dela. Ela já provou mio veze que esta do lado da Guarda Escarlate e é arma mais poderosa dali, então deveriam ver como ela realmente é, dar-lhe o devido respeito.
ResponderExcluirAcho a Mare muitoooo egoísta e impulsiva, ela não sabe se controlar, pensa como uma criança. E o pior é que agora com tudo isso, ela tem a sensação de ser mais inteligente e melhor em relação aos outros. Eu sempre associo isso ao fato dela ser muito nova ainda, 17-18 anos é bem jovem e portanto pessoas dessa idade agem como se soubessem de tudo quando nada sabem. O coronel ali teve um ponto, um ÓTIMO ponto, porque Mare só pensa no que ela quer, no que x coisa resultará para ELA. E isso é desde que entrou na Guarda, ela nunca pensa em prol de todos, mas sim dela.
ResponderExcluirE agora ela tá mega egocêntrica, agindo como se tudo girasse em torno dela e ela fosse a deusa de tudo. E as partes dela "quero que eles me olhem e vejam quem eu sou"? Patético
Ah gente q a mare se acha oq, vcs são burros, quero ver vcs no lugar dela vendo seu amigo preso e o otário do coronel mandando em vcs e dizendo q são fracos p ele. C fosse ela matava o coronel cuzao mesmo. E aquele amigo babaca dela tbm é um pé no saco c mete em tudo ela sabe os faz fica em cima dela o tempo todo não sei como ela aguenta .
ResponderExcluirEu achei q o marven era leal mais depois do q vi odeio ele e n confio em ninguém no livro a n ser a farley, julles, cal . Só
"Para minha surpresa, o coronel apenas ri da minha declaração.
ResponderExcluir— Nem tudo gira ao seu redor, srta. Barrow. O sol não se põe ou se levanta ao seu comando."
Ele disse tudo o que eu queria dizer.